O impeachment é um
instrumento de defesa do regime democrático. Faz parte da nossa Constituição.
Sua discussão, ou até mesmo sua propositura, desde que bem fundamentada, não é
nenhum golpe ou desrespeito às instituições democráticas. Ao contrário: pode até
ser um dever cívico contra um governante que prevarica no seu dever.
No regime presidencialista
(embora hoje, na prática, estejamos vivendo em um regime parlamentarista...), o
impeachment é um ato pelo qual se destitui, por deliberação do Legislativo, o ocupante
de cargo governamental que pratica crime de responsabilidade. O ex-presidente
Fernando Collor de Mello foi objeto dele. Aliás, foi o primeiro da nossa
história. O que enfim fortaleceu a tese defendida pela oposição – na qual,
sobretudo, se destacava, na época, a bandeira do bravo PT – foi uma Elba – um
veículo popular que se tornou o elo entre ele e seu tesoureiro. O remédio nem
precisava ser ministrado pelo Congresso, pois, antes dele, houve a renúncia. E
Collor, depois (durma-se com um barulho desses!), foi inocentado, no Supremo
Tribunal Federal (STF), do crime pelo qual foi acusado. Só que, nessa altura,
“Inês já era morta”...
Os petistas, numa época em
que eram opositores ferrenhos, fartaram-se de falar nele. As estatísticas estão
aí para quem quiser conferir: contra o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso,
propuseram o impeachment 14 vezes. Em compensação, contra o ex-presidente Lula,
seus adversários propuseram 34; e, contra a presidente Dilma, 17. Os pedidos
foram todos recusados. Em alguns deles, pela ausência de legalidade e/ou
legitimidade, os motivos apresentados chegaram a ser ridículos.
A corrupção não começou
com os governos do PT. Ela é “velha como a sé de Braga”, tanto no setor público
quanto no privado. Mas hoje, com certeza, é muito mais grave, além de envolver
muito mais dinheiro. Esse montante, absurdo, é que a torna mais intolerável
ainda. O que falta, então, à propositura do duro remédio é uma prova contra a
presidente. Um elo que a ligue aos malfeitores. É a prova – só ela – que
definirá se haverá ou não impedimento da presidente. Logo, é bom lembrar que
“prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”.
Por outro lado, defender
ou falar em intervenção militar em nosso país (como lamentavelmente tem
ocorrido), se não é equívoco, é má intenção. Essa defesa advém, sem nenhuma
dúvida, de pequena parcela da sociedade. E isso, infelizmente, só faz crescer a
preocupação dos que defendem a liberdade neste país. Pedir intervenção dos
militares é desprezar o presente e dar adeus ao futuro, além de homenagear um
trágico passado que, pela vontade esmagadora da maioria do povo brasileiro,
exposta recentemente nas ruas de todo o país, não voltará. E não voltará, além
de tudo, porque hoje os militares brasileiros estão mais do que conscientes de
que essa não é mais (se é que algum dia foi) a sua função. Como disse Cora
Rónai, em sua crônica em “O Globo” sobre as manifestações do dia 12 de abril,
“os idiotas e desmemoriados que pedem intervenção militar estão apenas
contaminando as passeatas”.
Enfim, o que tiver de ser,
será. Ninguém segura mais o trabalho da Polícia Federal e do Ministério Público
Federal. Está com razão, portanto, o ex-presidente Fernando Henrique quando
afirma que não faz sentido um partido pedir impeachment antes de um fato
concreto: “Impeachment não pode ser tese. Ou houve razão objetiva, ou não”.
Artigo publicado
originalmente no jornal O Tempo
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