Os conselhos regionais de
Veterinária não tem autoridade para proibir que os profissionais da categoria
façam qualquer tipo de trabalho social. A jurisprudência foi estabelecida pelo
Superior Tribunal de Justiça, em 2013, no julgamento de um caso de Santa
Catarina. A discussão sobre o tema voltou à tona na terça-feira (2/2), depois
que o Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV) de São Paulo impediu que
o profissional Ricardo Fehr Carmargo fizesse consultas e castrações de graça.
Segundo entendimento do
STJ, veterinários podem atuar de graça mesmo não estando vinculados a entidades
sem fins lucrativos.
O ministro Og Fernandes,
relator do caso catarinense no Superior Tribunal de Justiça, manteve a decisão
da primeira instância, afirmando que a sentença “contém fundamentos de índole
constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente para manter o
julgado”.
Na Seção Judiciária de
Florianópolis da Justiça Federal, o juiz citou o descaso do poder público com a
situação dos animais abandonados e evocou a Constituição, que estabelece o
direito ao meio ambiente equilibrado. Além disso, ressaltou que a lei que
regula a atuação dos conselhos veterinários não dá direito a eles de comandar
as atividades de controle populacional de cães e gatos.
“Seria necessário montar
equação matemática para visualizar a imensidão de indivíduos das espécies
canina e felina que poderiam advir a partir de duas ou mais ninhadas ao ano,
com início de vida fértil desde tenra idade e por muitos anos. Nesse contexto,
acentua-se a relevância social, sanitária e ambiental das campanhas de controle
populacional de animais domésticos (em especial quanto aos animais que vivem
nas ruas ou estão sob a guarda de famílias de baixa renda), inclusive com
esterilização cirúrgica, associada à educação para guarda consciente e
responsável de animais”, escreveu.
Comoção nas redes sociais
No caso mais recente, de
São Paulo, o veterinário decidiu expor sua situação ao resto da sociedade. Ao
ser proibido de continuar com o serviço gratuito, Camargo gravou um vídeo
relatando a situação e publicou nas redes sociais. Rapidamente causou comoção, com
mais de sete milhões de visualizações.
Pelo estatuto da
profissão, o serviço gratuito só é permitido em casos de utilidade pública, e
não pode ser feito sozinho. Em nota, o conselho esclareceu que ações desse tipo
são aquelas feitas por entidades sem fins lucrativos, como ONGs, instituições
públicas ou entidades e empresas a elas conveniadas.
"Vai ser aberto um
processo ético, ele vai ser notificado, vai ter ampla defesa para se justificar
e depois nós vamos ver dentro de uma sessão de especial de julgamento ético se
ele tem culpa ou não. Tem diversas penalidades, até a cassação do exercício
profissional", explicou o presidente do CRMV de São Paulo, Mário Eduardo
Pulga, em entrevista ao portal G1.
Reserva de mercado
inexistente
A posição do STJ é compartilhada
pelo advogado Eduardo Vital Chaves, sócio e responsável pela área de
Contencioso Cível Empresarial, Administrativo e Regulatório do escritório Rayes
& Fagundes Advogados Associados.
Ele entende que o
veterinário pode tomar medidas para regularização como vínculo a uma sociedade
civil, entidade, ONG ou instituição de utilidade pública para pleitear apoio e
verbas. E, assim, afastar a ameaça de suspensões. Porém, esse passo não é
obrigatório. Segundo o advogado, o conselho busca evitar a chamada captação de
clientela. “Mas, convenhamos, a reserva de um mercado que não tem condições de
gerar uma receita palpável não é coerente”, comenta.
Para Marcus Vinicius
Macedo Pessanha, sócio do escritório Nelson Wilians e Advogados Associados, a
regulação do CRMV visa o interesse público, mas é preciso observar o outro
lado. “O excesso de animais doentes e abandonados afronta o senso comum e o
sentimento de compaixão inerente ao ser humano. Impedir um profissional de
atuar caritativamente na redução do sofrimento desses animais é uma distorção
da atividade regulatória, que está sendo exercida de forma contrária ao
interesse público”, diz.
Consultor Jurídico