A mulher de um dos líderes
da organização criminosa Comando Vermelho, Luciane Barbosa Farias, foi recebida
por assessores do ministro da Justiça, Flávio Dino, duas vezes neste ano. A
informação, confirmada pelo Ministério da Justiça, foi divulgada nesta segunda-feira,
13, pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Luciane é casada há 11
anos com Clemilson dos Santos Farias, o Tio Patinhas, criminoso que chegou a
figurar no topo da lista dos mais procurados da polícia do Amazonas. Ele foi
preso em dezembro de 2022 e cumpre 31 anos no presídio de Tefé (AM).
Luciane, recebida por
assessores de Dino, também foi condenada no mesmo processo que o marido — por
lavagem de dinheiro, associação para o tráfico e organização criminosa —, mas
recorre em liberdade. No Ministério da Justiça, foi recebida como presidente de
uma ONG de defesa dos direitos dos presos do Amazonas.
Em nota ao Estadão, o
Ministério da Justiça disse que as reuniões foram solicitadas pela Associação
Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), com a presença de várias advogadas e
que Luciane, mulher do líder do Comando Vermelho, “não foi a requerente da
audiência, e sim uma entidade de advogados”.
“A presença de
acompanhantes é de responsabilidade exclusiva da entidade requerente e das
advogadas que se apresentaram como suas dirigentes”, diz a nota. “Sobre atuação
do Setor de Inteligência, era impossível a detecção prévia da situação de uma
acompanhante, uma vez que a solicitante da audiência era uma entidade de
advogados, e não a cidadã mencionada no pedido de nota.”
Segundo o Estadão, Luciane
costuma circular por Brasília acompanhada da advogada Camila Guimarães de Lima
e da a ex-deputada estadual pelo Psol Janira Rocha (RJ).
Luciane Barbosa Faria fez
postagem sobre a reunião com o secretário nacional de Políticas Penais do
Ministério da Justiça, Rafael Velasco Brandani, e com outras autoridades do
ministério de Dino .
Segundo o Estadão, Luciane
esteve com Elias Vaz, secretário Nacional de Assuntos Legislativos de Flávio
Dino, em 19 de abril. Em 2 de maio, ela se encontrou com Rafael Velasco
Brandani, secretário Nacional de Políticas Penais (Senappen).
Nesse mesmo dia, Luciane
esteve também com mais duas autoridades dentro do Ministério da Justiça: Paula
Cristina da Silva Godoy, titular da Ouvidoria Nacional de Serviços Penais
(Onasp); e Sandro Abel Sousa Barradas, diretor de Inteligência Penitenciária da
Senappen. O nome dela não consta das agendas oficiais das autoridades. Todos
esses assessores foram nomeados diretamente por Dino e são cargos de confiança
dele.
Luciane relatou a visita
às autoridades do ministério de Dino numa postagem no Instagram. Ela disse ter
feito “denúncias de revistas vexatórias” no sistema prisional amazonense e
afirmou ter apresentado um “dossiê” sobre “violações de direitos fundamentais e
humanos” supostamente cometidas pelas empresas que atuam nas prisões do Estado.
“Em resultado destas
reuniões o primeiro passo foi tomado em prol aos familiares visitantes de
reclusos onde as revistas vexatórias estão em votação com maioria favorável
para ser derrubada!”, escreveu a integrante do Comando Vermelho em seu perfil
da rede social sem explicitar a qual votação se referia.
Crueldade de “Tio
Patinhas” e crimes atribuídos a Luciane
O processo penal a que
respondem Luciane e o marido, ao qual oEstadão teve acesso, descreveu Clemilson
como um “indivíduo de altíssima periculosidade, com desprezo à vida alheia”. O
Ministério Público do Amazonas relata que o patrimônio dele veio do tráfico de
drogas e costuma ser cruel com seus devedores, “ceifando-lhes a vida sempre que
os crimes em que se envolve lhes torna credor”.
Sobre Luciane, o
Ministério Público do Amazonas afirmou que ela atuou como o “braço financeiro”
da operação do marido. “Exercia papel fundamental também na ocultação de
valores oriundos do narcotráfico, adquirindo veículos de luxo, imóveis e
registrando ‘empresas laranjas’.” Graças ao trabalho, ela “conquistou
confiabilidade da cúpula da Organização Criminosa Comando Vermelho”, escreveu o
procurador Mário Ypiranga Monteiro Neto, na denúncia apresentada em agosto de
2018.
A investigação também
mostra que o patrimônio do casal do Comando Vermelho cresceu mais de 1.000%
entre 2012 e 2015, depois que ela abriu um salão de beleza.
ONG atua na defesa de
integrantes do Comando Vermelho
A ONG de Luciane, a
Associação Instituto Liberdade do Amazonas (ILA), atua em prol dos detentos
ligados ao Comando Vermelho. Criada no ano passado, a organização também seria
financiada com dinheiro do tráfico, afirmou o Estadão, citando uma investigação
sigilosa à qual teve acesso.
A ONG seria, portanto,
apenas uma fachada usada pelo Comando Vermelho para “perpetuar a existência da
facção criminosa e obter capital político para negociações com o Estado”. De
acordo com trecho de uma investigação citado pelo jornal, as ações sociais
feitas pela entidade seriam, ao fim, sustentadas pelo Comando Vermelho “com a
arrecadação de seus membros”.