Documentos comprovam que Caixa banca benefícios sem receber do Tesouro


Vladimir Chaves

Pelos menos três documentos comprovam que, desde julho, a Caixa Econômica Federal (CEF) reclama dos repasses insuficientes do governo federal para atender programas sociais como o Seguro Desemprego e o Bolsa Família.

Os documentos revelados pelo jornalista Claudio Dantas Sequeira, da revista IstoÉ, comprovam que a prática conhecida como “pedalada fiscal”, descoberta pelo Contas Abertas no início do ano, não se limitou apenas aos investimentos federais e chegou, também, aos programas sociais.

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Os ofícios da CEF foram encaminhados à Câmara de Arbitragem da Advocacia-Geral da União (AGU), que avalia a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de conciliação quando estabelecida controvérsia de natureza jurídica entre órgãos e entidades da Administração Federal.
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Nos documentos, a CEF aponta que os repasses para o pagamento do Seguro-Desemprego e do Abono Salarial estão sendo realizados de “forma intempestiva e em volume insuficiente”, o que ocasiona saldo negativo nas contas do programa.

Na reunião de conciliação, o Ministério do Trabalho e Emprego informou que o próprio repasse do Tesouro Nacional é que está lento. De acordo com a Pasta, o problema é totalmente financeiro e já foi solicitado à Secretaria do Tesouro Nacional a liberação de recursos. O MTE também observou que previsões de pagamento do benefícios precisarão aumentar em R$ 9 bilhões em 2014.

No caso do Bolsa Família, a Caixa, responsável pelo pagamento do programa aos beneficiados, alerta que o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) tem realizado repasses intempestivos e insuficientes ao banco, o que resulta em saldos negativos nas contas do programa nos anos de 2013 e 2014. Os documentos não apresentam as explicações do MDS sobre o assunto.

Procurada pela reportagem da IstoÉ, a CEF negou qualquer problema. Por meio de nota, disse que os repasses “estão dentro da normalidade” e que o envio do caso à AGU seria apenas para “dirimir dúvidas”. Por meio de nota, o Ministério da Fazenda também negou “qualquer anormalidade”, ressaltando que o saldo nas contas dos programas este mês está positivo. O Ministério de Desenvolvimento Social repetiu a versão oficial.

Histórico da “pedalada”
No começo de 2014, o Contas Abertas denunciou esse tipo de contabilidade postergada. De 2013 para 2014 houve crescimento de 27,8% dos restos a pagar processados (quando só falta o pagamento do serviço prestado), ocasionado pela emissão de bilhões de reais em ordens bancárias nos últimos dias do ano — para que fossem sacadas apenas nos primeiros dias de 2014 — e também pela retenção de receitas estaduais e municipais.

Em dezembro, do dia 1º ao dia 27, a União pagou R$ 2 bilhões em investimentos (obras e equipamentos). No entanto, entre os dias 28 e 31 foram desembolsados R$ 4,1 bilhões. Em resumo, nos quatro últimos dias de 2013, incluindo sábado, domingo e véspera de feriado, o governo emitiu ordens bancárias no dobro do valor que lançara nos 27 dias anteriores.

As despesas que não foram realizadas em 2013 e ajudaram o superávit daquele ano, no entanto, criaram amarras para 2014, o que, possivelmente, incluiu os programas sociais, principais carros-chefe do governo federal.

Logo que foi confirmada a manobra orçamentária do governo, exatamente no dia 17 de janeiro, o Contas Abertas encaminhou denúncia ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União, com o intuito de que a Corte de Contas pudesse quantificar o real superávit primário de 2013 e tomar as medidas cabíveis em relação à “pedalada” que o governo federal realizou no final do ano passado.

O relatório anual das contas do governo federal, produzido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), deu ênfase ao expressivo montante de ordens bancárias emitidas em dezembro de 2013 para saque em janeiro de 2014. Mesmo com esclarecimentos do Tesouro Nacional, a Corte destacou que os pagamentos realizados na transição dos exercícios podem ter afetado os indicadores fiscais de 2013.


}De acordo com o relatório do TCU, assim como aconteceu em 2011 e 2012, a prática de postergar um montante materialmente relevante de saída de caixa de dezembro para janeiro pode ocasionar superavaliação do resultado primário do governo federal. O Tribunal chamou a atenção para o aumento a cada ano de ordens bancárias emitidas em dezembro, mas sacadas somente em janeiro, “o que pode afetar os indicadores fiscais dos exercícios considerados”.


Fonte: Contas Aberta