Senadores querem calar a Lava Jato, projeto de abuso de autoridade deve ser votado nesta quarta-feira.


Vladimir Chaves

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado Federal tem reunião marcada para esta quarta-feira (26), às 10h, com um único item na pauta: o substitutivo do senador Roberto Requião (PMDB-PR) para as duas propostas que definem os crimes de abuso de autoridade. Os textos vêm recebendo duras críticas de procuradores da Lava Jato e do juiz Sérgio Moro.

Na segunda-feira (24), procuradores da força-tarefa da Lava-Jato voltaram a publicar vídeo contra o projeto de abuso de autoridade. Eduardo El Hage, coordenador da operação no Rio de Janeiro, afirmou que a proposta coloca as investigações em risco. O vídeo foi publicado por Deltan Dallagnol, que comanda as investigações em Curitiba, em sua página no Facebook.

“Ele nos impede de fazer o nosso trabalho. É uma reação às investigações. A Lava-Jato está em risco. A independência do Judiciário e do Ministério Público está ameaçada. Sem independência, ficaríamos nas mãos de interesses escusos”, declarou El Hage.

Em outro vídeo, Dallagnol já havia afirmado que o projeto que criminaliza o abuso de autoridade será utilizado pelos congressistas para tentar silenciar a Lava Jato. “Admitir isso é calar de vez a força-tarefa da Lava Jato e o próprio juiz Sérgio Moro. Não permita que isso aconteça. Se manifeste contra essa lei, viralize esse vídeo, expresse a sua indignação, faça a sua voz ser ouvida pelos políticos. Vamos lutar juntos contra a impunidade e a corrupção”, disse Dallagnol.

O relator do projeto, senador Roberto Requião (PMDB-PR), criticou o posicionamento dos procuradores. Em sua conta no Twitter, Requião afirmou que eles parecem "alunos aplicados que saem para festejar o sucesso e tomam um porre". O senador acrescentou, em sua proposta, sugestões realizadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, mas isso não reduziu as críticas ao texto.

O próprio Moro já se manifestou contra o projeto. Para ele, ninguém é favorável a qualquer abuso praticado por juiz, promotor, ou por autoridade policial. Apenas o que se receia é que a pretexto de se coibir abuso de autoridade seja criminalizada a interpretação da lei.

“A redação atual do projeto, de autoria do senador Roberto Requião e que tem o apoio do senador Renan Calheiros, não contém salvaguardas suficientes. Afirma, por exemplo, que a interpretação não constituirá crime se for “razoável”, mas ignora que a condição deixará o juiz submetido às incertezas do processo e às influências dos poderosos na definição do que vem a ser uma interpretação razoável. Direito, afinal, não admite certezas matemáticas”, disse em artigo.

Moro também destaca que, em seu art. 3º, o texto permite que os agentes da lei possam ser processados por abuso de autoridade por ação exclusiva da suposta vítima, sem a necessidade de filtro pelo Ministério Público.

“Na prática, submete policiais, promotores e juízes à vingança privada proveniente de criminosos poderosos. Se aprovado, é possível que os agentes da lei gastem a maior parte de seu tempo defendendo-se de ações indevidas por parte de criminosos contrariados do que no exercício regular de suas funções”, aponta.

Tramitação
No último encontro da comissão, o relator leu seu voto, mas um pedido de vista coletivo impediu a análise do texto. A reunião foi marcada por divergência entre os senadores que queriam votar e outros que pediram mais tempo para análise.
Diante da divergência, o presidente da CCJ, senador Edison Lobão (PMDB-MA) bateu o martelo. “Poderia conceder [vista] por 24 horas, por 48 horas. Mas concederei vista coletiva por cinco dias, marcando a próxima reunião para quarta-feira. Nós não admitiremos mais obstrução e nenhuma outra chicana regimental”, afirmou Lobão.

Escolha
O voto de Requião tem como base os projetos de lei do Senado 280/2016, do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), e 85/2017; e o de Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que reproduz sugestões entregues ao Legislativo no fim de março pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a partir de sugestões de procuradores.

Requião optou por considerar prejudicado o PLS 280/2016 e levar adiante o PLS 85/2017, por considerar este último mais adequado para o tratamento da matéria.

O texto a ser analisado pelos integrantes da CCJ abrange os crimes de abuso cometidos por agentes públicos em sentido amplo, incluindo militares, servidores públicos e pessoas a eles equiparadas, além de integrantes do Ministério Público e dos poderes Judiciário e Legislativo de todas as esferas da administração pública: federal, estadual, distrital e municipal.

Crimes

O substitutivo de Requião estabelece mais de 30 tipos penais, punindo, por exemplo, o juiz que decretar prisão preventiva, busca e apreensão de menor ou outra medida de privação da liberdade em desconformidade com a lei. Também considera crime fotografar, filmar ou divulgar imagem de preso, internado, investigado, indiciado ou vítima em processo penal sem seu consentimento ou com autorização obtida mediante constrangimento ilegal.

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