Brasil avança, mas cresce com o freio de mão puxado


Vladimir Chaves

 


"Vocês dão três passos para frente e dois para trás." A frase dita pelo indiano Aswath Damodaran, um dos maiores especialistas em valuation do mundo, durante sua recente passagem pelo Brasil, foi recebida com desconforto — e razão. Para o empreendedor Guy R. Peixoto Neto, o comentário sintetiza com precisão a contradição que marca o desenvolvimento do país: o potencial é evidente, os avanços são reais, mas o progresso continua sendo freado por entraves que parecem não sair do lugar.

Nas últimas duas décadas, o Brasil construiu uma sólida reputação como celeiro de inovação na América Latina. É um dos maiores ecossistemas de fintechs do mundo, com mais de 1.500 startups no setor, e abriga nomes consagrados entre os unicórnios da região, como Nubank, Gympass, QuintoAndar e VTEX. Além disso, tem se destacado internacionalmente em áreas como tecnologia bancária, energia limpa e soluções agrotech.

Mas o cenário promissor convive com velhos obstáculos. O Brasil segue entre os países mais burocráticos para empreender, exigindo, em média, 1.501 horas por ano de uma empresa apenas para manter-se em conformidade com o sistema tributário — número quatro vezes superior à média da OCDE. O país ocupa a 87ª posição no ranking Doing Business 2020 do Banco Mundial, atrás de nações como Kosovo e Guatemala. Em outras palavras, embora a criatividade e a inovação floresçam, o ambiente institucional ainda sufoca o crescimento.

A observação, longe de ser apenas retórica, reflete o sentimento de muitos líderes empresariais no país. Entre eles, o empreendedor serial Guy Peixoto Neto, que vê nessa oscilação entre avanço e retrocesso um dos grandes desafios para a construção de um Brasil mais competitivo.

Fundador de mais de 11 empresas e mentor de negócios de alto crescimento, Peixoto é conhecido por seu trabalho junto a scale-ups e sua atuação como membro das organizações EO (Entrepreneurs’ Organization) e YPO (Young Presidents’ Organization). Ele alerta para o “custo oculto” de manter estruturas do século passado. “Essa crítica é não apenas ideológica, mas econômica. Quando o Estado mantém empresas ineficientes, o capital e o talento não vão para onde há valor real. Isso impede o crescimento de novas empresas, faz com que startups não escalem e impede a criação de legados”, escreve. A crítica de Damodaran nesse ponto é direta: a proteção do passado impede a chegada das novas joias.

O reflexo dessa mentalidade é visível no índice de sobrevivência das startups brasileiras. Segundo a McKinsey, apenas 10% das que recebem uma rodada Série A conseguem chegar à Série C. Não é por falta de bons empreendedores, mas por ausência de um ambiente que favoreça risco e crescimento. Ainda assim, Peixoto destaca que a força do país reside justamente nesses empreendedores que, mesmo diante das dificuldades, continuam avançando.

Ele cita exemplos inspiradores, como o de Roberta Sudbrack, que começou vendendo cachorro-quente e se tornou uma das chefs mais respeitadas do mundo; Viviane Senna, que transformou o legado do irmão em um dos maiores projetos educacionais do Brasil; Eduardo Lyra, fundador da ONG Gerando Falcões, que atua em favelas com uma mentalidade de startup; e Mariana Vasconcelos, criadora da Agrosmart, agtech que aplica inteligência artificial para promover agricultura mais sustentável.

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