A Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, produziu nota
técnica acerca da reforma da Previdência, que tramita por meio da Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) 287/2016. O texto destaca violações constitucionais
presentes nessas medidas e a possibilidade de questionamentos judiciais em
razão do nítido retrocesso legislativo que a Reforma representa.
O documento traz uma
análise detalhada das nove principais alterações sugeridas pela PEC da
Previdência: aumento da idade mínima para aposentadoria, equiparação entre
homens e mulheres, redução no valor do benefício, tratamento dado a
trabalhadores rurais, restrição na concessão de pensões, fixação de tempo para
aposentadoria especial, inacumulabilidade de benefícios e alterações nos
benefícios concedidos a idosos e a pessoas com deficiência.
De acordo com a
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, o aumento da idade mínima para a
aposentadoria – 65 anos de idade e 25 anos de contribuição – viola o princípio
da proteção aos idosos, previsto no art. 230 da Constituição. Isso porque a PEC
utiliza como referência para o cálculo de idade países cuja expectativa de vida
é bastante superior à brasileira.
“Dados da Organização
Mundial da Saúde apontam que a expectativa de vida média dos países que
delimitaram em 65 anos o corte para a aposentadoria é de 81,2 anos, enquanto a
expectativa de vida no Brasil é de 75 anos. Ou seja, indivíduos desses países
deverão viver 6,2 anos a mais do que um cidadão brasileiro”, esclarece o
documento.
A nota técnica também
aponta que o cálculo de idade apresentado pela PEC desconsidera ainda as
diferentes realidades regionais e de renda no Brasil, tornando a idade mínima
de 65 anos muito severa nos locais mais pobres e afrontando o objetivo
constitucional de erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais e
regionais – conforme previsto na Constituição Federal em seu art. 3º.
“Dados do IBGE de 2015
apontam que a esperança de vida ao nascer em Santa Catarina, por exemplo, é de
78,7 anos, mas a do Maranhão é de 70,3 anos. Em termos regionais, a diferença
de esperança de vida ao nascer é de 5,5 anos entre a Região Sul (77,5 anos) e a
Região Norte (72 anos)”.
No que se refere à
equiparação entre homens e mulheres no acesso ao benefício, a nota técnica
ressalta que esse tratamento jurídico desconsidera a diferente situação da
mulher no mercado de trabalho e nas atividades domésticas: “a mulher ainda
ocupa posições menos qualificadas e recebe remuneração inferior em relação aos
homens, isso quando exerce trabalho remunerado, pois ainda é frequente a
dependência econômica em relação ao marido, ao companheiro ou ao pai”.
Redução no valor das
aposentadorias
Para o órgão do Ministério
Público Federal, a redução no cálculo do valor das aposentadorias proposta pela
PEC constitui medida exageradamente severa, pois atinge inclusive as
aposentadorias de baixo valor.
“No Brasil, segundo a
Secretaria de Previdência do Ministério da Fazenda, o valor médio real dos
benefícios pagos pela Previdência Social, entre 2009 e 2016, em valores
atualizados, é de R$ 1.283,93, o que equivale a 1,46 salários mínimos, ou seja,
o valor médio dos benefícios é de menos de um salário mínimo e meio”.
Os dados revelam que as
aposentadorias pagas são baixas e não suportam uma redução percentual de valor
tal como proposta pela PEC: “a aposentadoria pelo valor integral ocorreria
apenas com 49 anos de contribuição, ou seja, alguém que tivesse iniciado as
contribuições aos 16 anos e viesse a aposentar-se aos 65, por exemplo”.
Quanto à proposta de
incluir o trabalhador rural nas condições gerais de aposentadoria – ou seja,
idade mínima de 65 anos e a exigência de pagamento de contribuição mensal – a
Procuradoria dos Direitos do Cidadão aponta que a medida desrespeita o princípio
constitucional da igualdade, pois provoca um efeito especialmente pesado sobre
camponeses, cujas condições de vida e trabalho costumam ser rudes.
Idosos e pessoas com
deficiência
As alterações propostas
para o pagamento de benefício assistencial a idosos e a pessoas com deficiência
também foram foco de análise. Para a PFDC, a orientação de que a oferta do
benefício passe a atender critérios de renda mensal familiar integral é
incompatível com o sistema de seguridade social previsto na Constituição Federal
em seu art. 194: “o benefício deixa de ser concedido com base em um critério
material e realista (pessoa com deficiência ou idoso que comprovem não possuir
meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família) para
ser concedido com base num critério puramente matemático-financeiro”, diz o
texto.
A nota técnica encaminhada
aos parlamentares destaca ainda violações à segurança jurídica dos
trabalhadores atingidos pelas regras de transição e implicações sistêmicas
decorrentes da restrição à concessão de aposentadorias – com impactos, por
exemplo, no direito à saúde e ao emprego.
O documento é assinado
pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, e pelo
procurador regional da República Walter Claudius, que é relator da PFDC para o
tema Previdência e Assistência Social.
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