Deputados, professores,
empresários e sindicatos defenderam ontem (26), em audiência pública na Câmara
dos Deputados, o diploma em jornalismo como remédio contra a picaretagem e a
divulgação de conteúdos falsos. Eles sugeriram a aprovação de uma proposta de
emenda à Constituição (PEC 206/12) que reinstitui a obrigatoriedade do
documento para o exercício da profissão no Brasil. O debate foi promovido pela
Comissão de Comunicação.
“Em um cenário onde a
gente tem a maioria da população se informando por redes sociais, nós
precisamos qualificar cada vez mais o jornalismo praticado no Brasil”, disse a
presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Samira Cunha.
Para ela, o jornalismo
profissional é o antídoto contra a onda de desinformação e de notícias falsas
(fake news) que atinge todo o mundo. “Vivemos em uma sociedade que se baseia em
mentiras propagadas em larga escala e com objetivos específicos, e deixamos de
lado o papel de um profissional que se capacita, no mínimo, por quatro anos
para exercer um papel fundamental na democracia.”
Samira Cunha revelou que
atualmente, sem a necessidade de diploma, há casos de menores de idade e de
analfabetos com registro profissional de jornalista no País.
Fim do diploma
Em 2009, após 40 anos de
vigência da regulamentação que exigia o diploma de nível superior para o
exercício no jornalismo no Brasil (Decreto-Lei 972/69), o Supremo Tribunal
Federal (STF) decidiu que qualquer pessoa, independentemente de formação, pode
assumir as funções de jornalista.
Os ministros atenderam a
um recurso do Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São
Paulo (Sertesp) e do Ministério Público Federal (MPF). O Sertesp alega que a
exigência do diploma é inconstitucional porque a Constituição garante a todos o
direito à liberdade de expressão e ao livre pensamento.
Para a presidente da
Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo, Marluce Zacariotti, a
obrigatoriedade do diploma em nada compromete a liberdade de expressão. “O
jornalista não manifesta sua opinião nas notícias e reportagens que escreve,
portanto a exigência do diploma não lhe garante a alegada exclusividade no
direito à manifestação do pensamento pela mídia ou por qualquer outro meio”,
disse.
Relator do caso no STF, o
ministro Gilmar Mendes já havia concedido liminar em 2006 permitindo o
exercício da atividade aos que atuavam na área mesmo sem graduação em
jornalismo ou registro profissional. Em 2009, a conclusão de Mendes foi que “a
formação específica em cursos de jornalismo não é meio idôneo para evitar
eventuais riscos à coletividade ou danos a terceiros”.
Retrocesso
O diretor da Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), Armando Rollemberg, disse que a decisão foi um
retrocesso e alertou para consequências desastrosas para a sociedade.
“O jornalismo é tudo que
não tem a ver com a mentira. Dentro do jornalismo cabe a liberdade de
expressão, mas na liberdade de expressão não cabe à mentira”, pontuou. “A
mentira interesseira, odienta, articulada, em um pouco mais de 24 horas, pode
trazer prejuízos enormes para a sociedade. Às vezes não é nem possível fazer
uma retratação equivalente”, acrescentou.
Jornalista e professor, o
deputado Amaro Neto (Republicanos-ES), que propôs o debate, defendeu a formação
em jornalismo como instrumento de garantia da qualidade do trabalho. “Eu
acredito que um grande passo para acelerar o combate às fake news é tornar o
diploma de jornalismo obrigatório por meio dessa PEC que está parada aqui na
Casa”, disse.
Também jornalista, o
deputado Daniel Trzeciak (PSDB-RS) criticou a decisão do STF e também defendeu
a PEC. “Queria perguntar ao ministro Gilmar Mendes se ele faria uma cirurgia
com algum médico que não tivesse sentado nas cadeiras do curso de medicina”,
questionou.
O parlamentar afirmou que
o fim da obrigatoriedade do diploma desvalorizou a função dos cursos de
jornalismo. “Hoje ninguém mais quer fazer faculdade de jornalismo. Para que
ficar quatro anos estudando jornalismo se nem do diploma precisa?”, criticou.
A PEC
Em análise na Câmara dos
Deputados, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 206/12, do Senado,
reinstitui a obrigatoriedade do diploma de nível superior específico em
jornalismo para o exercício da profissão no Brasil.
O texto, porém, prevê que
o diploma não será exigido de quem produz trabalho de natureza técnica,
científica ou cultural na sua área de formação para ser divulgado em veículos
de comunicação. Exemplos disso são advogados, médicos e técnicos de diversas
áreas que escrevem artigos para jornais.