Quando tentou comprar a
National Beef Packing Co. e a Smithfield Beef Group Inc., ambas com sede nos
EUA, em 2008, a produtora brasileira de carne bovina JBS SA foi recebida por
uma onda opositora.
Procuradores-gerais de 13
estados americanos entraram com ações contra a empresa, que tem sede em São
Paulo, alegando que a aquisição da National Beef, quarta maior embaladora dos
EUA, ameaçaria a precificação competitiva ao criar um oligopólio liderado pela
JBS, pela Tyson Foods Inc. e pela Cargill Inc.
Em campanha, Hillary
Clinton disse ao Rapid City Journal, de Dakota do Sul, que seria contrária à
compra da Smithfield e que iria “combater a consolidação”.
A família Batista, que
controla a JBS, não desanimou. Desistiu da aquisição da National Beef, concluiu
a compra da Smithfield e transformou a JBS em um império alimentar global --
tudo com a ajuda de um banco estatal.
Com uma receita de R$ 110
bilhões (US$ 45 bilhões) nos últimos 12 meses, a JBS ofuscou a Vale SA neste
ano e se tornou a maior empresa do Brasil depois da Petrobras. E também
transformou cinco dos seis filhos do fundador da JBS, José Batista Sobrinho, em
bilionários em dólares.
“Eles administram um
negócio apertado”, disse Revisson Bonfim, chefe de análise de mercados
emergentes da Sterne Agee Leach em Nova York. “Eles entram onde há muitos desperdícios
e sabem como remover o desperdício. As aquisições sempre estiveram no DNA
deles, mas foi depois que eles mudaram para os EUA que a coisa decolou”.
Após realizar mais de US$
17 bilhões em aquisições, a JBS agora tem operações em cinco continentes e em
21 estados brasileiros. Os Batista, que não têm parentesco com o outrora
bilionário brasileiro das commodities Eike Batista, estão sendo impulsionados
pela maior recuperação das ações do índice da Bovespa neste ano. A JBS deu um
salto de 53 por cento nos últimos seis meses, empurrada pelo incremento dos
preços da carne bovina e pelo fato de a Rússia ter cancelado a proibição para
as fábricas de processamento de carne do Brasil.
Bilionários ocultos
Os cinco irmãos Batista --
Joesley, Wesley, Valere, Vanessa e Vivianne Batista -- têm uma participação
equivalente na J&F Investimentos SA, a empresa holding por meio da qual
eles e outros membros da família controlam a JBS e também investimentos em
bancos, celulose, gado, produtos de limpeza e construção. Nenhum deles jamais
apareceu individualmente em um ranking internacional de riqueza.
Um porta-voz da JBS disse
que os irmãos preferiam não comentar essa reportagem e respondeu a outras
perguntas sobre a empresa em um e-mail. Um sexto irmão, José Batista Júnior,
vendeu sua parte no negócio e se comprometeu a investir R$ 100 milhões para
concorrer ao cargo de governador de Goiás, mas depois deixou a disputa para
abrir caminho para um companheiro membro do PMDB.
O pai, José Batista
Sobrinho, iniciou o império familiar do setor alimentício nos anos 1950, quando
o presidente Juscelino Kubitschek implementou o plano "cinquenta anos em
cinco" para acelerar a construção de Brasília, a nova capital do Brasil.
Batista, que começou abatendo cinco cabeças de gado por dia, ajudava a fornecer
carne para os trabalhadores que construíam a cidade.
Aquisições
O BNDES aprovou R$ 287
milhões em empréstimos para a empresa de José Batista Sobrinho antes de a
companhia comprar as operações da Swift Co. na Argentina, em 2005. Quando a JBS
vendeu ações em uma oferta pública, em 2007, o braço de investimentos do banco aprovou
uma participação de R$ 1,1 bilhão para ajudar a adquirir a Swift, na época a
terceira maior empresa de carne bovina e suína dos EUA. De propriedade do
Tesouro brasileiro, o BNDES anunciava a criação de uma “multinacional
brasileira”.
Mais aquisições vieram na
sequência, entre elas a da Pilgrim’s Pride, com sede em Pittsburgh, EUA, a da
canadense XL Foods e a de quatro processadoras de carne brasileiras. A JBS
adquiriu a empresa de lácteos Vigor em 2009 como parte da aquisição do Grupo
Bertin SA. O banco converteu R$ 3,5 bilhões de títulos locais da JBS em ações
em 2011. O BNDES aprovou R$ 6 bilhões em ações e R$ 2,4 bilhões em empréstimos
em uma década.
“O setor de carne bovina
estava desorganizado, dividido, informal”, disse um porta-voz do BNDES em um
e-mail. O ambiente “não permitia que o Brasil tirasse vantagem das vantagens
competitivas do setor, um relevante criador de empregos”.
Batista, 81, transformou
seus filhos em membros do conselho da empresa em 2005. Os irmãos Joesley, 42, e
Wesley, 44, ampliaram sua importância dentro da empresa ao longo da expansão,
até assumirem o comando, que estava nas mãos do pai, como presidente do
conselho e presidente executivo da JBS, respectivamente.
Rich Vesta, que chefiou as
operações da JBS nos EUA até 2010, disse que o apoio do BNDES não deveria
diminuir o trabalho dos irmãos na empresa.
Desordens mentais
Os irmãos Batista são
especialistas em introduzir eficiências em matadouros recentemente adquiridos,
que dependem de trabalho manual, disse Vesta. Os trabalhadores aumentam as
margens de lucro sendo os mais rápidos para separar as carcaças penduradas em
cortes comercializáveis. A JBS tem mais de 200.000 trabalhadores e capacidade
para abater 100.000 vacas, 72.000 porcos e 13 milhões de aves por dia. A rotina
nos frigoríficos pode ter um preço para os funcionários.
As ocorrências de
desordens mentais e dos tecidos moles são três vezes maiores do que em outros
setores, segundo procuradores do trabalho. Um trabalhador da JBS quase perdeu
um braço tentando consertar um tanque de descarga congestionado em 2012, no
estado do Mato Grosso. A polícia foi chamada para sua casa, em janeiro, depois
que ele tentou serrar o membro paralisado como se fosse a cartilagem de uma
carcaça bovina. A JBS disse que não teve culpa.
“É tenso”, disse Elias
Vasconcelos da Costa, que recebia cerca de US$ 750 por mês em uma fábrica em
Mato Grosso desossando até 50 carcaças por hora. “É preciso ser forte”.
‘Ritmo frenético’
Os tribunais brasileiros
raramente decidem a favor dos empregadores nos processos trabalhistas, que
podem se estender por anos. Em um caso recente, o Tribunal Superior do Trabalho
ordenou que a Seara, uma unidade da JBS, pagasse R$ 10 milhões a trabalhadores
que foram demitidos por exigir intervalos no estado de Santa Catarina.
O juiz Alexandre Agra
citou um “ritmo frenético” a temperaturas próximas de zero grau e a falta de
intervalos apropriados. A empresa não respondeu a um pedido para comentar sobre
o caso.
A JBS também foi acusada
de comportamento predatório. A senadora Kátia Abreu, ex-presidente da
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), acusou a empresa de
“formação de monopólio” e disse que o apoio do BNDES é prejudicial para a
concorrência. Em um discurso no Congresso, ela acusou a JBS de enganar os
consumidores com uma campanha publicitária que os encorajava a optar por sua
marca Friboi por causa de seu selo de inspeção federal, quando mais de 200
outros matadouros também tinham sido aprovados em inspeções.
Influência política
Pelo menos um dos
bilionários não gostou das declarações de Kátia Abreu. Em novembro, Joesley
Batista se reuniu com o ministro da Casa Civil de Dilma Rousseff, Aloizio
Mercadante, e fez lobby contra Kátia Abreu como potencial ministra da
Agricultura por causa de suas críticas a respeito da empresa em discursos no
Congresso, segundo um funcionário do governo com conhecimento do assunto, que
pediu anonimato porque a reunião não foi pública. As preocupações de Batista
não afetarão a escolha de Dilma, disse a fonte.
A JBS, que neste ano foi a
maior doadora da campanha de reeleição de Dilma, assim como da campanha do
candidato derrotado, Aécio Neves, negou que esteja usando influência política
para fazer lobby contra Kátia Abreu. A empresa disse que a existência de concorrência
é uma prova do livre mercado.
O BNDES, que possui ações
em mais de 130 empresas, detém uma participação de 25 por cento nessa empresa
em ascensão, ao mesmo tempo em que ela se torna a maior financiadora de
campanhas políticas do país. Embora empresas estatais não tenham permissão para
financiar campanhas, o BNDES diz que não existe proibição quando as firmas
estatais são acionistas minoritárias.
“Existem mais de 1.500
abatedouros operando no país”, disse a JBS. “A empresa não concorda que a participação
do banco em seu capital interfira na concorrência”. A Caixa Econômica Federal,
outro banco estatal, também tem uma participação na JBS.
As empresas J&F,
lideradas pela JBS, financiaram quase um terço dos parlamentares da Câmara dos
Deputados e distribuíram recordes R$ 387 milhões em ações nas eleições de 2014,
segundo o Tribunal Superior Eleitoral.
O alcance de seu
financiamento de campanha, que visa a apoiar o “debate democrático”, reflete
seu tamanho como a maior empresa do Brasil, disse a JBS.
“Todas as doações da
empresa seguem rigorosamente as leis eleitorais do Brasil”, disse a JBS em uma
resposta por e-mail.
Fonte: MSN Dinheiro /
Bloomberg.