O Túnel de Ezequias, também
conhecido como Túnel de Siloé, é uma das maiores obras de engenharia hidráulica
da Antiguidade. Escavado diretamente na rocha sólida sob a colina de Ofel, na
cidade de Jerusalém, por volta de 701 a.C., durante o reinado do rei Ezequias
de Judá, ele se tornou um elemento vital na sobrevivência da cidade diante das
ameaças militares, especialmente o cerco assírio conduzido por Senaqueribe.
Essa passagem subterrânea
estratégica desviava as águas da fonte de Giom, localizada fora das muralhas da
cidade, para um reservatório protegido dentro da cidade, o Tanque de Siloé. A
sua existência mostra não apenas habilidade técnica notável para a época, mas
também o cuidado e a sabedoria do rei Ezequias ao preparar Jerusalém para
resistir às agressões inimigas.
Contexto Histórico e Bíblico
O cenário político do século
VIII a.C. era marcado pelo expansionismo do império assírio, que avançava cada
vez mais pelo Oriente Médio. O rei Ezequias, que governou Judá aproximadamente
de 715 a 686 a.C., é descrito na Bíblia como um líder fiel a Deus e reformador
religioso (2 Reis 18–20; 2 Crônicas 29–32; Isaías 36–39).
Temendo o avanço de
Senaqueribe, rei da Assíria, Ezequias tomou medidas defensivas, espirituais e
práticas para preparar Jerusalém. Uma das mais notáveis foi o projeto de
canalização da água:
"Vendo, pois, Ezequias
que Senaqueribe vinha e que estava resolvido a atacar Jerusalém, teve conselho
com os seus príncipes e os seus homens valentes para taparem as fontes das
águas, que havia fora da cidade; e eles o ajudaram." (2 Crônicas 32:2–3)
E mais adiante: "Este
Ezequias tapou a nascente superior das águas de Giom e as fez correr por baixo
para o lado ocidental da cidade de Davi." (2 Crônicas 32:30)
A Obra de Engenharia
O túnel tem cerca de 533
metros de extensão, escavado na rocha sólida. O mais surpreendente é que dois
grupos de operários trabalharam a partir de direções opostas e se encontraram
quase perfeitamente no meio, um feito incrível considerando os recursos disponíveis
à época. A técnica empregada envolvia escavação com ferramentas simples, como
cinzéis de ferro.
O trajeto é em forma de
serpentina e levemente inclinado, permitindo que a água fluísse da Fonte de
Giom, situada no vale do Cédron (lado leste da cidade), até o Tanque de Siloé,
localizado no lado sul da antiga Jerusalém, dentro das muralhas.
A Inscrição de Siloé
Em 1880, arqueólogos
descobriram dentro do túnel uma inscrição em hebraico antigo conhecida como
Inscrição de Siloé. Trata-se de uma das mais antigas inscrições hebraicas
conhecidas e descreve o momento dramático em que os dois grupos de escavadores
se encontraram:
“E aconteceu que, enquanto
[os escavadores] ainda estavam com o cinzel, cada homem em direção a seu
companheiro, e enquanto ainda havia três cúbitos a escavar, foi ouvida a voz de
um homem chamando ao seu companheiro — pois havia uma fenda na rocha do lado
direito e do lado esquerdo. E no dia da perfuração os escavadores cortaram,
cada um indo ao encontro do outro, cinzel contra cinzel, e a água fluiu da
fonte para o reservatório por 1.200 côvados...”
Essa inscrição é um
testemunho extraordinário da engenharia e também da mentalidade do povo de Judá
em proteger sua cidade.
Importância Estratégica e
Sobrevivência Durante o Cerco
A Fonte de Giom era o único
suprimento de água doce da região e estava exposta fora dos muros da cidade.
Caso um inimigo a controlasse, Jerusalém estaria perdida. Ao canalizar essa
água para dentro dos muros, Ezequias privou os inimigos do acesso à água e
garantiu abastecimento à população em caso de cerco.
Quando Senaqueribe cercou
Jerusalém em 701 a.C., conforme descrito na Bíblia e confirmado em registros
assírios (como os Anais de Senaqueribe), a cidade resistiu. O profeta Isaías
também menciona essa época como uma manifestação da fé e da providência divina.
Segundo o relato bíblico,
Jerusalém foi poupada milagrosamente:
"Então saiu o anjo do
Senhor e feriu no arraial dos assírios cento e oitenta e cinco mil..." (Isaías
37:36)
Descoberta e Arqueologia
Moderna
O túnel foi redescoberto por
exploradores ocidentais no século XIX e hoje é acessível a visitantes. O túnel
ainda está em funcionamento, com água corrente de Giom para Siloé. A Inscrição
de Siloé foi removida em 1890 e está atualmente no Museu Arqueológico de
Istambul, na Turquia.
Arqueólogos modernos veem o
túnel como uma das maiores provas arqueológicas de eventos bíblicos, por reunir
dados textuais, históricos e físicos numa mesma estrutura.
Fé, Estratégia e
Sobrevivência
O Túnel de Ezequias é uma
união de fé, sabedoria administrativa e capacidade técnica. Ele permitiu a
sobrevivência de Jerusalém diante de um império esmagador e ainda hoje é
testemunho da engenhosidade de um povo que confiava em Deus, mas que também se
preparava com responsabilidade.
Mais do que um túnel, ele
representa o esforço de um rei justo em proteger seu povo e sua fé — e reforça
o princípio bíblico de que preparação e confiança em Deus caminham juntas.
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